Malfeitos, greves e nacos de privilégios

por Onevair Ferrari em 30.05.2018

O Brasil chegou a ter uma das maiores malhas ferroviárias do mundo. Dispõe de uma das maiores redes fluviais do planeta e uma faixa costeira gigantesca, o que permitiria um intenso transporte aquaviário fluvial e de cabotagem. Há aeroportos subutilizados e uma lamentável concentração em dois ou três grupos econômicos no transporte aéreo nacional, majoritariamente de passageiros. O modal dutoviário é ainda mais incipiente e enfrenta enormes desafios de regulamentação para ser expandido.

É fácil perceber, então, que o verdadeiro nó não está nos “caminhoneiros”, mas na matriz de transporte do país, extremamente concentrada no modal rodoviário. A origem histórica dessa concentração remonta aos interesses da indústria automobilística em suas mais diversas ramificações, desde siderurgia até autopeças. Soma-se também um forte viés de influência da cultura norte americana, centrada no automóvel, num país de dimensões igualmente continentais. Mas o surpreendente mesmo é que, durante décadas, pouco foi feito para mudar esta realidade.

Greves são decorrentes de impasse e, por vezes, muito válidas para manifestar situações de desequilíbrio, com propostas justas de solução. Mas, outras vezes, podem servir a interesses completamente diferentes dos que as deram origem ou ainda a interesses muito localizados.

Todos se identificaram, inicialmente, com os “caminhoneiros” em seu papel de vingadores. Mas, depois de muitos transtornos e algum tempo para refletir, a pergunta é a quem os resultados realmente beneficiam e se não acabam por evidenciar que todos querem seu naco de privilégios. Assim como os “caminhoneiros” com diesel subsidiado e os taxistas, que não pagam imposto integral na compra de seus automóveis, outros profissionais poderiam também reivindicar o mesmo nos insumos e equipamentos necessários ao seu ofício.

O que aconteceria se outras categorias se (des)mobilizassem reivindicando sua parcela de privilégios? Agricultores clamando por subsídios em sementes, defensivos e implementos agrícolas, professores por livros, cursos de atualização e equipamentos de apoio a novas metodologias de ensino, e até Gerentes de Projeto reivindicando alíquotas reduzidas de impostos e remuneração por percentual do valor dos projetos, como fazem, para defender muitas das causas, os advogados!

Passada a crise aguda e continuando a crise crônica, as greves impactaram as mais diversas áreas da economia brasileira já tão combalida com os sucessivos “malfeitos”.

Greves e “malfeitos” prejudicam igualmente os projetos. Ficou claro para todos, que na triste realidade de concentração no modal rodoviário, é mesmo verdade que, sem caminhões o Brasil realmente para. Talvez o que não esteja tão claro é que sem projetos não há futuro!

Onevair Ferrari, DSc, MSc, PMP é professor, consultor, palestrante, coach em Gerenciamento de Projetos e diretor da Nexor.
© Copyright 2013 Nexor Consultoria e Gerenciamento. Todos os direitos reservados.