Quase tudo deu errado

por Onevair Ferrari em 25.01.2016

Em 2010 apresentei um trabalho no 24th IPMA World Congress, o congresso anual da International Project Management Association, naquele ano realizado em Istambul, intitulado Contracting Projects in Brazil: challenges and opportunities of a rising golden decade. O clima no Brasil era de otimismo, quase euforia, com a perspectiva de muitos projetos para a década que estava por começar. O PIB crescia 7,6%, a taxa de desemprego estava em 6,7%, o dólar a R$1,66; a inflação em 5,9%; o Ibovespa a 69.300 pontos e a ação da Petrobras a R$24,65.

O pipeline de projetos previa investimentos de US$10 bi para a Copa, US$7 bi para a Olimpíada, US$20 bi para o pré-sal e US$261 bi para infra-estrutura, segundo dados da revista Exame de então. Aquele contexto tornava o Brasil um dos melhores lugares do mundo para investir naquela década.

Passados 5 anos, chegamos na metade do caminho com uma situação diametralmente oposta, de pessimismo, quase desespero, com poucos projetos realizados, tantas oportunidades perdidas e nenhuma perspectiva de recuperação a médio prazo. O PIB encolhe 3,5%, a taxa de desemprego beira os 10%, com o fechamento de 1,5 milhão de postos de trabalho, o dólar está a R$4,10; a inflação em 10,7%; o Ibovespa a 38.000 pontos e a ação da Petrobras a R$4,80 - menos que um refrigerante.

A mesma The Economist que anunciava a “decolagem” do Brasil em 2009 questionou a condução da nossa economia em capa de 2013 e agora, em 2016, destaca a queda do nosso país e associa sua condução política ao desastre.

Ao longo destes 5 anos, à medida que nosso otimismo ia esfriando, pudemos identificar pelo menos 7 pragas – aqui colocadas na ótica de Gerenciamento de Projetos – que nos levaram a esta situação:

Project Charter não basta! Projetos vendem bem os candidatos: os projetos são anunciados de maneira irresponsável, sem estudos de viabilidade adequados, sem avaliação de alternativas, sem planejamento. Mas impressionam a população mais despreparada e alavancam votos para seus idealizadores.

Riscos, que riscos? Engana que eu gosto: os programas políticos, hollywoodianos, tratam de mostrar uma realidade que não existe, enganando grande parte da população com projetos mirabolantes. O país das maravilhas aqui, só existe para algumas poucas Alices.

Stakeholders. Para os amigos tudo: pessoas não qualificadas ocupam posições importantes nos ministérios, nas empresas públicas, nas agencias governamentais, selecionadas apenas por conchavos políticos. A incompetência na gestão levou aos resultados desastrosos “nunca vistos na história deste pais”.

Scope Creep Farm. Obras sem projeto: por mais que o Brasil seja o país do improviso, não é possível fazer grandes obras – como as de infra-estrutura – sem projeto. Os únicos interessados em fazer obras sem projeto são as empreiteiras. Não é preciso dizer mais nada, basta ver a Lava Jato.

O céu é o limite para a Curva S. Projetos potencializam a corrupção: projetos têm alta densidade de gastos e representam grandes oportunidades para corrupção, desvios e roubalheira. Junte-se a isso uma combinação terrível de ignorância da maior camada da população, falta de interesse de grande parte da camada mais esclarecida e rabo preso de uma pequena parcela que se beneficia desta situação e tem-se o caldo ideal para que os “malfeitos” aconteçam.

O patrocinador. Eu ganhei, nós empatamos vocês perderam: não faltaram cerimônias de lançamento de projetos e fitas de inauguração para os pouquíssimos projetos concluídos, no melhor do ufanismo populista. Mas até os mais ingênuos dos eleitores foram capazes de perceber o muito que ficou pelo caminho, a montanha de recursos desperdiçados, os desvios, os enganados e os que verdadeiramente se aproveitaram desse trem da alegria.

Sem Matriz de Responsabilidades! Não é culpa de ninguém: os responsáveis alegam que não sabiam de nada. Impera o esquema da responsabilidade diluída, no qual, se der errado, não é culpa de ninguém. Alguns estavam longe, na sala ao lado. Outros eram apenas “usufrutuários em vida”. Todos se mostram inocentemente surpresos.

Projetos são motores de desenvolvimento. O Brasil precisa de projetos. Mas para serem bem sucedidos e efetivamente contribuírem para o desenvolvimento do país, é necessário que sejam selecionados com critérios técnicos e econômicos – e não apenas políticos – e que profissionais qualificados e competentes – e não apadrinhados políticos – sejam chamados para planejar, executar e controlar sua realização.

Quem permitiu esta situação? Você, eu e todos os brasileiros que deixaram isso acontecer, alguns por desprezo, outros por indiferença, a maioria por inação.

Quem paga a conta? Você, eu e todos os brasileiros que trabalham honestamente, pagam impostos e cumprem suas obrigações.

Quem pode mudar esta situação? Você, eu, e todos os brasileiros que se sentem roubados e querem de volta um país melhor para as próximas gerações.

A solução está em cada um de nós. E aí, você está pronto para participar da mudança?

Onevair Ferrari, DSc, MSc, PMP é professor, consultor, palestrante, coach em Gerenciamento de Projetos e diretor da Nexor.
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